Que devemos fazer?”, perguntaram as multidões a São João Batista (Lc 3,10). Trata-se da pergunta mais importante que podemos colocar a Jesus. E o que devemos, pois, fazer? A resposta de João Batista é muito simples: pratiquem a justiça (Lc 3,11.13.14).
A Polícia Civil do Tocantins (PCTO) passa por um processo que pode mudar o patamar da instituição. Trata-se de um caminho sem volta cujo resultado é certo: a credibilidade da instituição. Como é de conhecimento, nos últimos meses, influenciadas pela Operação Catarse, várias cidades do estado tem intensificado o combate à corrupção por meio de investigações de funcionários fantasmas, fraudes em licitações dentre outras. O combate à corrupção já é uma marca da PCTO.
A repercussão, como não poderia ser diferente, tem sido gigantesca e muito positiva (para a instituição). A mídia séria tem noticiado quase que diariamente os resultados das investigações, desempenhando sua função constitucional de informar. Ora, a liberdade de imprensa é condição fundamental para que um Estado seja considerado Democrático de Direito.
Por outro lado, o governo, principal atingido com os resultados das investigações, tem visto sua credibilidade desabar e está se articulando nos bastidores para minimizar esse revés.
As recentes operações demonstram que, no Tocantins, não há discriminação no combate à criminalidade. Homicidas, estupradores, latrocidas e traficantes não podem receber tratamento diferenciado de corruptos, corruptores, fraudadores de licitação e funcionários fantasmas.
Mais uma vez é importante destacar o papel da imprensa na robusta cobertura jornalística dada ao trabalho da Polícia Civil. O acesso às informação, no Estado Democrático de Direito, é necessário e corresponde à observância do direito de informação em consonância com a liberdade de imprensa – direitos fundamentais consagrados em diversos dispositivos constitucionais a exemplo do artigo 5º IX e XIV e artigo 220 da CF.
Como mencionado, o farto arcabouço probatório produzido nas investigações em curso atingiu diretamente o primeiro escalão do Palácio Araguaia (chegando até mesmo a se cumprir mandado de busca e apreensão na sede do Governo Estadual), manchando sua imagem. O contra ataque do governo, ao que tudo indica, é iminente. Pelo que se sabe, o que mais tem incomodado não são as investigações em si, mas a ampla divulgação nos meios de comunicação. Dessa forma, visando frear essa diária exposição negativa, há fortes rumores de que está sendo elaborada uma regulamentação às entrevistas pelos delegados de polícia.
Uma nítida limitação ao direito de informação e uma verdadeira tentativa de calar os profissionais que têm se dedicado com afinco no combate a todo e qualquer tipo de criminalidade. Se esta regulamentação efetivamente for publicada, será um dos maiores retrocessos do estado do Tocantins. Por certo, as medidas necessárias (administrativas e judiciais) serão tomadas no sentido de evitar e/ou combater qualquer indício de ilegalidade ou inconstitucionalidade arrastado com aludida regulamentação.
Não se está aqui a defender um super poder da imprensa. Para que a imprensa possa cumprir seu papel na sociedade é imprescindível que ela seja livre de interdições e censuras, mas não pode ser ilimitada e ausente de responsabilidade, haja vista que ser livre significa ser responsável. Ao assumir a liberdade se assume a responsabilidade que dela se origina.
Nem censura e nem poderes ilimitados. Como já ensinava o filósofo grego Aristóteles, há mais de dois mil e trezentos anos: “a virtude está no meio”.
É importante esclarecer também que a elogiável cobertura da mídia não desrespeita o sigilo do inquérito policial – garantia insculpida no artigo 20 do Código de Processo Penal. Vejamos o que diz esse dispositivo:
“A autoridade assegurará no inquérito osigilo necessárioà elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade”. (grifo meu).
A interpretação que se dá a esse artigo é no sentido de que cabe à Autoridade Policial, conforme a conveniência da investigação, resguardar sigilo ao inquérito policial quando for de interesse da sociedade. Esse sigilo não é obrigatório para todos os casos. Há hipóteses em que a publicidade é conveniente na medida em que qualquer pessoa do povo pode vir a contribuir, fornecendo informações de que tenha conhecimento. E é justamente isso o que tem ocorrido nas investigações mencionadas. Após a repercussão midiática, inúmeras informações (anônimas ou não) chegaram ao conhecimento da polícia, possibilitando o êxito da operação, além de outras investigações correlatas.
O Papa Paulo VI já dizia: “Se queres a paz, prepara a justiça” (Mensagem para o 5º Dia Mundial da Paz, 1º de janeiro de 1972). Nesse sentido, o atual momento histórico em nosso estado é único. Fortalecido pelo clamor popular anticorrupção que foi fator preponderante para a eleição presidencial, os tocantinenses também veem com bons olhos e com avaliação positiva o tsunami provocado pela Polícia Civil. A PCTO apenas busca realizar um trabalho de excelência. A parceria com a imprensa é essencial e não seria nada inteligente uma regulamentação que visasse a limitação das informações e, por consequência lógica, a restrição da liberdade de imprensa. Esse é o caminho para uma polícia autônoma, para melhores condições de trabalho, para um policial valorizado. O principal reconhecimento já foi alcançado, o reconhecimento que verdadeiramente interessa, o da população.
Bernardo José Rocha Pinto é titular da Delegacia Regional de Polícia Civil de Pedro Afonso, graduado pela UFT em 2004 e pós-graduado em Investigação Policial.