Trabalho atualmente num pequeno município de aproximadamente seis mil habitantes, onde a presença da polícia é sentida de forma mais intensa conforme a atuação. Há pouco tempo um cidadão trabalhador rural do pequeno município chegou a mim e questionou: onde estão os vagalumes? A princípio não entendi a pergunta, mas o senhor que questionou, me conhece como Delegado de Polícia na cidade e sei que a questão era sobre Segurança Pública.
Ao indagar o senhor o motivo da pergunta, ele me respondeu em linguagem própria que estava falando sobre polícia ostensiva, viatura caracterizada e, principalmente, giro-flex numa analogia a vagalume. O ribeirinho estava sentindo falta de policiais fardados nas ruas da pequena cidade e disse que precisava de mais polícia vestida para evitar os acontecimentos, pois durante o dia e durante a noite não se via de forma constante aqueles carros com nomes de polícia e a luz vermelha piscando. Pois bem, temos muito respeito pela Polícia Militar do Tocantins, mas o que percebemos em diversos municípios do estado é a reclamação de que o policiamento preventivo não está ocorrendo ou acontece de forma diminuta.
A Constituição Federal no §5 do Art.144 apregoa que: Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública (…). A partir daí se entende que a Polícia Militar precisa ser visualizada pela população para evitar que os crimes ocorram. Numa cidade de pequeno porte, se o serviço for eficaz, teremos um local muito mais tranquilo sem dúvidas.
Na Delegacia onde exerço minhas atribuições, o número de ocorrência tem aumentado nos últimos meses e o próprio cidadão comunicante no Boletim de Ocorrência, menciona que não conseguiu falar com a Polícia Militar no momento do acontecimento do crime na rua, ou se o policiamento tivesse passado naquela rua teria inibido o crime.
O que está acontecendo para esse fenômeno de falta/diminuição do policiamento ostensivo está ocorrendo em vários municípios? Como profissional da área de segurança pública e trabalhando diretamente com outras corporações policiais, posso visualizar alguns motivos. Sabemos que existe uma demanda de policiais militares no Estado do Tocantins, pois existe até um concurso com mil vagas que ainda não foi concretizado, o número de policiais militares que estão se aposentando é muito grande, e inclusive, no município onde trabalho acabou de se aposentar mais um sem reposição para infelicidade do ribeirinho e da população daquele município.
Mas o problema não se resume a isso. Atualmente, presenciamos uma verdadeira guerra por atribuições e sabe-se que, não obstante a falta de policiais fardados nas ruas, muitos deles estão sendo utilizados em serviços eminentemente investigativo, ou seja, sem farda, o que se torna uma atribuição conferida no âmbito estatual às polícias civis.
A Constituição Federal no §4 do Art.144 preceitua que: Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais (…).
A esperança pelo ciclo completo contribui para essa antecipação e mexe com o sistema de segurança pública hoje estabelecido pela Constituição Federal e demais leis. A P2 (policial militar sem farda) investiga crimes comuns isso constitui uma realidade não somente no Estado do Tocantins. Recentemente, a Polícia Militar do Estado do Pará criou um curso de Delegado de Polícia Militar e um curso de Escrivão para militares de baixa patente, e isso reflete bem os anseios pelo ciclo completo que permitirá aos militares estatuais realizarem investigação de crimes comuns e autuações em procedimentos.
Trata-se de uma realidade não muito distante, pois um dos candidatos a Presidente da República é militar e como tal buscará defender os ideais da classe castrense. Não cabe aqui discutir o mérito do ciclo completo para polícia, assunto que divide opiniões até dos próprios militares. Porém, enquanto isso não acontece, a população precisa que cada instituição policial assuma suas atribuições, pois elas se concatenam na medida em que, se não ocorrer o policiamento preventivo para evitar os delitos, haverá uma sobrecarga na polícia judiciária devido ao aumento no número de ocorrências e consequentemente, lentidão nos demais processos relacionados à persecução penal.
O senhorzinho do pequeno município onde trabalho não entende a fundo sobre segurança pública, mas sente as consequências de suas falhas. A metáfora do vagalume serve para termos um senso crítico sobre o assunto segurança pública e tentar entender qual o melhor modelo, se existe necessidade de um ciclo completo, ou se na verdade falta investimento e comprometimento no modelo já estabelecido pela Constituição Federal, o certo que enquanto não houver mudanças a luz não pare de piscar.
Perfil: Marco Aurélio Barbosa Lima é Delegado de Polícia Civil do Tocantins; formado em Direito pela FIESC de Colinas – TO e Letras pela Unitins de Araguaína – TO; especialista em Direito Público pela Unitins e pós-graduando em Ciências Criminais pela Faculdade Estácio