Inicio a coluna desta semana pedindo escusas, pois desta vez não versarei sobre temas de ordem jurídica ou de combate à criminalidade, ou ainda, técnicas de investigação. No entanto, o tema abordado abrange, também, uma pequena parte das diversas atribuições do trabalho de um Delegado de Polícia.
Era início da noite do último domingo quando cheguei com minha família à agitada Praia da Graciosa, na capital Tocantinense. Confesso que estranhei a intensa movimentação de viaturas policiais entre praianos.
Mais adiante, encontrei um conhecido que me reportou que mais cedo alguns disparos de arma de fogo foram ouvidos naquele local e que ele estava justamente num estabelecimento próximo quando tudo ocorreu.
O relato se assemelhou ao Caos!
De acordo com o narrador, foram alguns disparos sucessivos, mas que logo cessaram. O mais importante para esta coluna não é o ilícito em questão, mas o comportamento das pessoas diante do risco.
Passo a análise comportamental da comunidade no “palco” dos eventos e a apontar, humildemente, a falhas de procedimento do ponto de vista de um Operador de Segurança.
Os disparos foram efetuados a certa distância do local onde o narrador e seus familiares estavam, tanto que não puderam ter uma certeza visual dos acontecimentos. Ele e sua família correram para a parte de trás de uma construção, mas houve pessoas que sequer saíram das mesas do estabelecimento onde estavam. Ou pior, teve um sujeito que simplesmente se levantou para ver se enxergava melhor a cena.
A primeira regra num incidente como este é: procure determinar a origem/direção dos disparos. Esta diretriz é muito importante, pois você deve seguir na direção oposta. Recordo-me de ocorrências Policiais nas cidades do interior em que os curiosos, as vezes até crianças, queriam estar o mais próximo possível da abordagem, quase participando da ação.
De modo que não posso deixar de citar uma situação passada, de roubo à instituição financeira com reféns, em que o vendedor de milho assado queria montar sua banca de vendas em frente à agência durante a ocorrência! Garanto aos leitores que isso não é fruto de minha mente criativa. Esta imagem surreal ocorreu, de fato, em cidade próxima à capital deste Estado.
Em segundo lugar: abaixe-se! Ao se abaixar você diminui sua silhueta, deixando de ser um “alvo fácil” (justamente ao contrário daquele curioso que se levantou).
Por último, ainda abaixado, procure um abrigo seguro. Entenda que “seguro” são construções sólidas, de concreto, de aço, ou com vários obstáculos à frente. Alvenaria simples e lataria de veículos não são barreiras eficazes para projéteis de armas de fogo.
Pode parecer forçoso, mas meu conhecido conseguiu flagrar uma família inteira usando como barricada uma porta de vidro e um sujeito se escondendo atrás de uma vegetação. Lembre-se, não estamos brincando de “esconde-esconde”.
Apesar de seguir um protocolo correto, meu narrador não conseguiu vencer a curiosidade e manteve-se parcialmente exposto, vez que podia ver as pessoas que estavam mais próximas ao local do disparo correndo na direção oposta.
Pelo que me foi descrito e pela posição das viaturas Policiais, o ponto central da ocorrência foi em campo aberto, portanto sem proteção segura nas imediações. O que fazer nestes casos?
Em campo aberto, ao invés de somente se abaixar, deite-se imediatamente, e espere a situação se encerrar. Desta forma você diminui, de maneira eficaz, a probabilidade de ser atingido. E ao sair simplesmente correndo na direção oposta, você continua sendo um alvo e ainda corre riscos em via pública, como o de atropelamento.
Após encontrar local seguro, acione imediatamente a Polícia Militar através do serviço 190. Se possível, permaneça na sua “fortaleza” até a chegada das forças de segurança. No caso tratado, o narrador me reportou que em pouquíssimos minutos a Guarda Metropolitana e a Polícia Militar estavam no local.
Finalmente, vença a curiosidade. Com o avanço tecnológico e as redes sociais você, com certeza, saberá o que aconteceu sem ter que se expor.
A função destas orientações não é a de assustar a população, particularmente a palmense. Não estamos em zona de conflito. Muito pelo contrário. É preciso vencer barreiras como esta para esclarecer e preparar a população.
Em países desenvolvidos treinamentos de situações de risco e tragédias são ensinados desde a infância e ensaiados de maneiras exaustivas nas empresas. Não significa pregar o Caos pelo Caos! Mas justamente estar pronto para evitá-lo, diminuindo riscos e capacitando a população em geral para situações extremas que, por ventura, possam ocorrer.
CASSIANO RIBEIRO OYAMA
É Delegado de Polícia Civil do estado do Tocantins, formado em Direito pela PUC-PR e pós-graduado pela Escola da Magistratura do Paraná