O país passa por um momento histórico e o nosso glorioso Estado do Tocantins ocupa a vanguarda desta transformação, posição de destaque que se deve, também, ao apoio que a Polícia Civil e demais órgãos fiscalizadores, como Ministério Público e a Defensoria Pública têm recebido da população através de denúncias anônimas.
Pontualmente versamos sobre o combate à corrupção e à devassa aos cofres públicos que se tornou, sem margem para questionamentos, o maior problema de criminalidade atualmente, pois começa a descer o véu de que não era o tráfico de entorpecentes que financiava os demais crimes, mas sim o desvio do dinheiro público que, não só, impossibilitou o combate efetivo ao crime organizado da maneira como conhecíamos, mas também revela a estreita ligação entre os crimes (e criminosos) do “colarinho branco” e toda e estrutura das Organizações Criminosas (ORCRIM).
Nesta batalha, ganhamos o mais forte dos aliados, pessoas inconformadas que sempre souberam dos “esquemas de seus vizinhos”, que batiam no peito para dizer que eram mais espertos que os demais e que tinham alguma vantagem, econômica ou não, de origem “política”. Estes cidadãos comuns resolveram se erguer e não mais permanecerem calados, no entanto, por medo de represálias das ORCRIMS, estas pessoas se valem do instrumento da DENÚNCIA ANÔNIMA.
Por óbvio, uma simples denúncia anônima não pode, por si só, dar início a um Inquérito Policial. A base do processo inquisitivo formal deve ser mais robusta, vez que pode dar causa a constrangimento irreparável ao investigado, ante à possível exposição do mesmo nesta condição. Justamente por este motivo as denúncias anônimas passam por uma minuciosa triagem investigativa prévia, com a finalidade de confirmar, da maneira célere e informal, a veracidade mínima das informações trazidas na denúncia. Desta forma, após descoberta de um indicativo de que a denúncia guarda respaldo com a realidade instaura-se o Inquérito Policial. Entenda-se que com a Verificação Preliminar da Veracidade das Informações trazidas na denúncia anônima, o Inquérito Policial passa a ter como exordial as próprias diligências investigativas e não a denúncia apócrifa.
Uma análise prematura do artigo 5º, inciso IV, da Constituição Federal pode trazer à conclusão equivocada da vedação, pura e simples, ao anonimato. Porém, o espírito do constituinte não foi este, vez que o citado dispositivo legal alcança as “manifestações”, tendo como essência a proteção da livre manifestação sem a ofensa à honra e à integridade de outrem, ou seja, protege os direitos de personalidade dos cidadãos.
Desta forma, se a denúncia anônima, por si só, não tiver capacidade de atingir os direitos de outrem, não estaria eivada de inconstitucionalidade, motivo pelo qual a Autoridade Policial, ao verificar preliminarmente a verossimilhança da denúncia, exclui a possibilidade de violação à personalidade e, só então, dá início à investigação com capacidade de devassar a vida do investigado.
Além disso, da própria Constituição extraímos outros axiomas que se sobrepõem à vedação ao anonimato, como o interesse público e social de uma Investigação Policial e a própria responsabilidade generalizada sobre Segurança Pública. Passamos a imaginar que através de um telefonema o interlocutor, sem se identificar, revela detalhes de um homicídio apontando o local onde provas, ou até mesmo os autores, podem ser encontrados. É razoável que o Delegado de Polícia determine uma diligência cautelosa e simples que, caso confirme a informação anônima, possa dar início a um Inquérito formal.
Da mesma forma estamos procedendo no tocante aos crimes contra a Administração Pública. Desde o final de 2018 até a presente data são dezenas de denúncias anônimas que chegam aos gabinetes dos Delegados de Polícia Civil de todo o Estado. Na maioria dos casos a triagem inicial não extrapola, sequer, os muros da Delegacia de Polícia, pois demanda uma análise prévia de documentos e dados que, na maioria dos casos, confirma o indicativo de veracidade das denúncias.
Os tempos estão mudando. O pensamento e, por conseguinte, o comportamento da população também. Ter conhecimento sobre a prática de um crime, mesmo que de maneira imprecisa, e não passar este informe para a Autoridade Policial não é moralmente aceitável, além que constituir importante ferramenta no combate a crimes, como a corrupção e o desvio de verbas públicas.
Utilizando-se de termo não técnico, é hora de passarmos nosso Estado “a limpo” e contamos com a ajuda incondicional do cidadão de bem. Esta luta só pode ter um lado vencedor, o que caminha ao lado da verdade e de legalidade.
Cassiano Ribeiro Oyama é Delegado de Polícia Civil, Adjunto na 1ª DPC de Palmas, formado em Direito pela PUC-PR e pós-graduado pela Escola da Magistratura do Paraná.